Existe mesmo plástico biodegradável?

Em 2023, a produção global de plástico atingiu aproximadamente 413,8 milhões de toneladas métricas. Esse número equivale ao peso de cerca de 40 mil estádios do Maracanã completamente cheios. Desse total, cerca de 50% são plásticos descartáveis de uso único, como embalagens, sacolas e garrafas, que rapidamente se transformam em lixo. A produção de plástico tem um impacto ambiental alarmante. Apenas 9% de todo o plástico gerado no mundo é reciclado, enquanto a maior parte acaba em aterros sanitários (cerca de 50%), é incinerada (19%) ou descartada de maneira inadequada no meio ambiente (22%). 

Todos os anos, aproximadamente 11 milhões de toneladas de plástico chegam aos oceanos, representando uma ameaça direta à vida marinha. Caso medidas eficazes não sejam adotadas, essa quantidade pode triplicar até 2040. Muitos animais marinhos ingerem resíduos plásticos ao confundi-los com alimento, o que pode causar sufocamento, intoxicação e desnutrição. Estima-se que mais de um milhão de aves marinhas e cerca de 100 mil mamíferos marinhos morram anualmente devido à poluição plástica.

Além disso, ao se decompor, o plástico libera substâncias químicas nocivas que contaminam ecossistemas terrestres e aquíferos. O impacto do plástico também se estende às mudanças climáticas. Tanto sua produção quanto sua degradação liberam milhões de toneladas de gases de efeito estufa, como CO2 e metano, agravando o aquecimento global.

E partículas microscópicas de plástico já foram detectadas na água potável e em diversos alimentos, levando à ingestão involuntária de microplásticos. Pesquisas indicam que um ser humano consome, em média, cerca de 5 gramas de plástico por semana — o equivalente ao peso de um cartão de crédito.

Entre as alternativas para lidar com a poluição plástica, estão os plásticos biodegradáveis. Saiba mais a seguir:

O que é? O plástico biodegradável é um material que, em condições adequadas, pode ser decomposto por microrganismos, como bactérias e fungos, transformando-se em substâncias naturais, como água, dióxido de carbono (CO2) e biomassa, sem deixar resíduos tóxicos no meio ambiente.

Mas é preciso descartá-lo corretamente. “Nem todos os plásticos rotulados como biodegradáveis se decompõem em ambientes naturais, muitos requerem compostagem industrial”, ressalta Bianca Maniglia, professora do IQSC/USP (Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo).

“Isso gera confusão e, às vezes, pode ser usado como estratégia de greenwashing”, alerta, referindo-se à prática de fazer produtos parecerem mais ecológicos ou sustentáveis do que realmente são.

Do que é feito?

Os plásticos biodegradáveis são feitos de matérias-primas renováveis (como amido de milho, cana-de-açúcar ou óleos vegetais) ou derivados de polímeros sintéticos modificados para facilitar sua biodegradação. É importante lembrar que o plástico tradicional é produzido a partir de derivados de petróleo e não se decompõe facilmente, acumulando-se no meio ambiente por centenas de anos.

Para um polímero ser considerado biodegradável, é preciso que ele seja degradado por microrganismos existentes na natureza em um ambiente natural ou controlado (por exemplo, na compostagem industrial). O processo deve resultar em produtos seguros, sem toxicidade para o meio ambiente.

Que produtos já oferecem opções em plástico biodegradável?

  • Embalagens alimentícias (copos, talheres, facas, pratos, filmes plásticos). 
  • Frascos de cosméticos (como xampus).
  • Sacolas compostáveis, usadas no varejo em geral e na coleta de resíduos orgânicos (saco de lixo).
  • Produtos médicos (como suturas e cápsulas de medicamentos).
  • Vasos para plantas e mudas.
  • Filmes de cobertura para o solo (na agricultura).

Quais os principais tipos de plástico biodegradável?

  • O PLA (Ácido Polilático) é feito a partir de fontes como amido de milho ou cana-de-açúcar. Pode ser usado em embalagens e utensílios descartáveis.
  • O PBS (polibutileno succcinato) é obtido por fermentação de biomassa, e é usado em filmes e sacolas.
  • O PBAT (polibutileno adipato tereftalato) é um polímero sintético que combina biodegradabilidade com flexibilidade, e é utilizado em sacolas compostáveis.

Como funciona o processo de biodegradação do plástico?

A biodegradação ocorre quando os microrganismos começam a atacar as pequenas cadeias dos polímeros já com tamanho adequado e com condições ambientais favoráveis.

Entre essas condições estão o calor, com temperatura próxima de 37°C (ou, no caso de compostagem, em torno de 55 °C), umidade, tipo de solo, pH do ambiente, presença de oxigênio (biodegradação aeróbia) ou ausência de oxigênio (biodegradação anaeróbia).

O processo ocorre em etapas:

– Fragmentação: o material plástico é quebrado em partes menores devido à exposição a fatores ambientais como luz UV, calor, umidade e oxigênio, além da ação de enzimas produzidas por microrganismos.

– Bioestabilização: microrganismos começam a metabolizar os polímeros fragmentados, quebrando suas ligações químicas por meio de enzimas específicas. 

– Assimilação: os produtos resultantes da biofragmentação são absorvidos pelas células microbianas.

Mineralização: os compostos orgânicos degradados são completamente convertidos em substâncias simples, como sais minerais, água, dióxido de carbono (gás carbônico) e amônia, por exemplo. O tempo de degradação pode variar de semanas a anos, dependendo do tipo de plástico e das condições ambientais. Os copinhos ou garfinhos feitos com derivados de PLA, por exemplo, se degradam em aproximadamente 1 mês.

Plásticos biodegradáveis se degradam se forem jogados na rua?

Quando os plásticos biodegradáveis são descartados na rua ou na natureza, sem nenhum controle e longe do ambiente adequado para sua degradação, podem permanecer no ambiente por longos períodos, causando impactos negativos semelhantes aos dos plásticos convencionais.

Para agir, os microrganismos precisam de condições ambientais específicas que podem ser controladas de maneira eficiente em instalações de compostagem industrial.

“Como nem sempre temos as condições ideais, os plásticos biodegradáveis devem ser coletados e destinados ao reaproveitamento pela reciclagem mecânica, química ou mecanoquímica, ou para incineração ou combustão”, diz Lucia Helena Mei, professora de ciência dos materiais da FEQ/Unicamp (Faculdade de Engenharia Química da Universidade Estadual de Campinas).

“A escolha do processo mais adequado e sustentável dependerá da emissão de gases de efeito estufa. Quando o plástico biodegradável entra em combustão, ele libera CO2, contribuindo para o efeito estufa se o gás não for capturado e/ou transformado em outro produto não tóxico”, completa.

Quais os impactos dos plásticos biodegradáveis para o meio ambiente?

Positivos:

– Redução do tempo de decomposição em comparação ao plástico convencional

– Menor acúmulo de resíduos plásticos em aterros e ecossistemas

– Diminuição do uso do petróleo como matéria-prima.

Negativos:

– Se descartados incorretamente, podem não biodegradar como esperado.

– Podem competir com a produção de alimentos, pois usam matérias-primas agrícolas

 – Sua produção pode demandar alto consumo de energia e água.

O plástico biodegradável é uma solução para o problema do lixo plástico?

O plástico biodegradável pode ser uma das alternativas para contornar esse problema. Mas, para isso, precisa ser destinado adequadamente e ser submetido a vários processos existentes para tratar o lixo plástico em geral.

Por isso, na avaliação da pesquisadora Bianca Maniglia, o plástico biodegradável não é uma solução completa.

Segundo ela, ele pode reduzir a persistência de resíduos no ambiente, mas apresenta limitações, como a dependência de condições específicas para a biodegradação e a infraestrutura limitada para compostagem industrial em muitos países, além de não resolver o problema do consumo excessivo e do descarte inadequado.

“Acredito que a verdadeira solução requer uma abordagem integrada, incluindo redução do consumo de plásticos, incentivo à reutilização, reciclagem eficiente e desenvolvimento de materiais alternativos”, diz Bianca.

Qual a diferença entre plásticos biodegradáveis e oxibiodegradáveis?

A distinção entre plásticos biodegradáveis e oxibiodegradáveis reside no processo de degradação e nos impactos ambientais que cada um gera. Como dito acima, os plásticos biodegradáveis podem ser decompostos por microrganismos, como bactérias, fungos e algas, resultando em substâncias naturais, como água, dióxido de carbono (CO2) e biomassa, sem deixar resíduos tóxicos. Essa degradação ocorre sob condições específicas, como em solo, ambientes aquáticos ou instalações de compostagem industrial.

Já os plásticos oxibiodegradáveis são polímeros derivados do petróleo, como polietileno e polipropileno, que contêm aditivos pró-degradantes. Esses aditivos aceleram a fragmentação do material quando exposto ao oxigênio e à luz UV. No entanto, esse processo gera microplásticos, que podem permanecer no meio ambiente e afetar ecossistemas. Diferentemente dos biodegradáveis, os oxibiodegradáveis não se decompõem completamente em biomassa, o que reduz seu potencial benefício ambiental.

Outro ponto de alerta são os chamados “plásticos verdes” (PE ou polietileno verde), que, embora produzidos a partir de matérias-primas renováveis, como a cana-de-açúcar, não são biodegradáveis e apresentam o mesmo potencial de acumulação ambiental que o polietileno convencional (PE), exigindo atenção para o descarte adequado.

Já foram encontrados microrganismos que podem biodegradá-lo, mas é necessário que as pesquisas sobre esse processo avancem, de acordo com Lucia Helena Mei, professora de ciência dos materiais da FEQ/Unicamp (Faculdade de Engenharia Química da Universidade Estadual de Campinas).

Fonte: Bianca Maniglia, professora do IQSC/USP (Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo) e uma das pesquisadoras da USP responsáveis por desenvolver plásticos biodegradáveis a base de matérias-primas de origem vegetal e resíduos agroindustriais; Lucia Helena Innocentini Mei, professora de ciência dos materiais da FEQ/Unicamp (Faculdade de Engenharia Química da Universidade Estadual de Campinas), coautora do livro "Nanocompósitos poliméricos - Síntese, caracterização e propriedades" e coorganizadora do livro "Bioplásticos: biodegradáveis & biobased".

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